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quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Clarissa à Bolonhesa




Já passavam das onze quando Clarissa resolveu jantar. Não por fome, ou porque tinha passado o dia todo no escritório e não havia almoçado. Resolveu jantar apenas por falta de opção. Não estava num momento muito criativo para trabalhar na nova campanha de detergente, nada de interessante passava na TV, e os gêmeos já estavam dormindo. Retirou do freezer uma das caixas de lasanha e atirou-a no microondas. Já que estava de pé, e entediada, resolveu também beber uma dose de wisky. Clarissa jamais se imaginaria, na vida, bebendo wisky. Para ela, wisky era coisa desses velhos gorduchos engravatados, que em uma mão seguram o copo da bebida, e na outra, um lenço para enxugar o suor que, assim como no copo, brota da generosa cabeça calva. Evidente que todos a sua volta também jamais imaginariam vê-la com um copo de wisky. Clarissa era daquele tipo frágil de mulher. Ela não deveria ter mais que um metro e sessenta, tinha os cabelos curtos, na altura dos ombros, e negros. Mais negro que seu cabelo eram seus olhos. Talvez por um motivo de contraste, já que sua pele tinha o mesmo bronzeado que uma folha sulfite, seus olhos gritavam naquele rosto tão delicado. Quando pequena seu avô materno a chamava de olhos de jaboticaba, pois, segundo ele, tinham o tamanho da fruta e a alegria da primavera. Os grandes olhos de Clarissa já não são mais comparados com fruta, e já não são tão alegres. Há um ano, Clarissa e Vinicius, seu marido, saíram para uma viagem de um final de semana. Iriam comemorar a volta de Clarissa ao trabalho. Eles eram pais agora, e com isso, completava-se a vida perfeita daquele casal. Conheceram-se no primeiro ano da faculdade, namoraram, noivaram, e se casaram. Alguns diziam que ambos perderam a virgindade juntos, mas um boato de que Vinicius havia transado com Débora, a “garota corrimão” do curso de gastronomia, deixava algumas suspeitas no ar. A viagem foi digna de um conto de fadas. Pareciam que tinham voltado à época do inicio de namoro, onde qualquer olhar, qualquer sorriso faz com que os pêlos do braço se arrepiem. No caminho de volta, o casal apaixonado estava ansioso para voltar para casa, passar no apartamento da mãe de Clarissa e pegar os gêmeos. Mas isso não aconteceu. Vinicius perdeu o controle do carro numa curva estreita. No momento em que o carro dava cambalhotas no ar, o corpo do homem foi atirado longe, e caiu fazendo um barulho seco no asfalto, ainda molhado pela chuva. Com Clarissa, apenas ferimentos leves, mas Vinicius morreu horas depois, no hospital. Desde então, Clarissa adotou esse novo comportamento. Agora ela bebia, já não se cuidava, e o único motivo para continuar vivendo era seus filhos, que fora obrigada pelo destino a criá-los sozinha.
Completou o copo com wisky, e tomou puro, num gole. Quando o copo bateu na mesa de centro lembrou que deveria ter bebido com limão e sal, mas logo em seguida se deu conta de que estava bebendo wisky e não tequila. A bebida já começava a dar sinal, sugeriu ela num risinho contido de canto de boca. Caminhou pelo comprido corredor até o quarto dos gêmeos. Parou diante da porta e se apoiou no batente. A respiração dos seus filhos a tranqüilizava, e por ela, passaria a noite ali, de pé diante deles. Tentou se aproximar, mas pisou num dinossauro de plástico que soltou uma espécie de som que mais parecia o escapamento de uma moto. Era melhor sair dali, antes que o wisky a fizesse derrubar as prateleiras também.
Foi caminhando lentamente pelo corredor. Imaginou que tipo de mãe estava se tornando. Que talvez ela não fosse uma boa mãe para os meninos, e que, eles estariam melhores se ela também tivesse morrido naquele acidente. Ou melhor, que eles estariam melhores se só ela tivesse morrido naquele acidente. Descobriu então, que o seu único motivo de viver, já não era um motivo. Agora, Clarissa tinha um motivo para não viver. Ela não merecia que aquelas duas crianças a chamassem de mãe. Os dois teriam uma vida bem melhor se morassem com sua mãe, por exemplo, ou com a mãe do Vinicius, que mora na praia. Realmente eles iriam ser bem mais felizes.
No final do corredor uma grande janela de vidro hipnotizou Clarissa. Ela caminhou até lá, decidida, como se fosse fazer uma coisa rotineira, do qual já esta até um pouco entediada. Abriu a grande vidraça, e uma brisa primaveril invadiu o corredor. Seus cabelos eram massageados pelo vento, a brisa tocava seu rosto como um conquistador toca o rosto de sua amada. Subiu no parapeito. A imponente cortina branca dançava com agressividade no ar, como asas de uma grande borboleta. Inclinou-se um pouco e pôde ver a rua lá em baixo. Não enxergava bem de longe, mas teve quase certeza que não havia uma pessoa, se quer caminhando. Nem carros. Estava completamente sozinha, como tem sido desde que Vinicius se foi. Soltou as mãos das laterais da janela. Enquanto se inclinava, aos poucos, pensava nos filhos. Pensou no seu avô, que quando era vivo sempre lhe comprava balas de yogurte; pensou na felicidade da sua mãe no dia da sua formatura, e pensou no sorriso de Vinicius, no dia do casamento.
Um apito agudo trouxe Clarissa de volta para a realidade. Voltou sua cabeça para dentro do apartamento e sentiu o cheiro forte de lasanha, que perfumava todo o ambiente. Se deu conta que não havia comido o dia todo, e estava faminta. Clarissa comeu então toda a lasanha, trabalhou um pouco na campanha de detergente, e dormiu abraçada com gêmeos, sabendo que, afinal de contas, ela não era uma mãe tão má assim.
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Filosofia




Mais um dia começava. Mais uma segunda-feira. Para a maioria das pessoas, segunda-feira é um dia odioso, mas para aquele grupo de estudantes, que se aglomeravam na escadaria da faculdade, era diferente. Segunda-feira era um dia incrivelmente absurdo. Dia de aula de filosofia. Filosofia só no nome, porque aquelas aulas serviam para tudo, menos para filosofar.
E de algum lugar, do inferno ou do asilo provavelmente, vinha ele. Daniel descia às escadas em direção a sala em meio a muita energia negativa, pois como de costume, os alunos mais sensatos desejavam que ali acontecesse um escorregão. Não para matar, ou para quebrar algum membro, mas só uma boa torção e um constrangimento público seriam o suficiente. Mas isso nunca acontecia. O velho caminhava com passos curtos e firmes, e segurava sua maleta com tamanha satisfação que pareciam amantes caminhando em Paris. Pensando por esse lado, certamente a maleta era sua única amante. O corte de cabelo franciscano, que devido a idade era obrigatório, fazia sua careca refletir os suaves raios de sol daquela manhã. Na sua face, a serenidade era similar a do Rei Herodes, pouco antes de mandar que cortassem a cabeça de João Batista. Sim, naquele dia muitas cabeças iriam rolar.
A Prova final do professor Daniel era sempre temida pelos alunos. Alguns haviam estudado, alguns haviam feito cola, e alguns haviam se apegado a crenças religiosas, pois somente um milagre os salvaria. Mas para o professor, aquilo tudo era sensacional. Fora o bingo, dar aulas era, provavelmente, seu único meio de lazer. Não acredito que um ser humano com aquela linha de pensamento seja muito inclusa socialmente.
Sentaram então nas cadeiras já devidamente perfiladas. Quem apelou para as colas, teve que apelar para a fé, já que Daniel caminhava freneticamente pela sala a procura do seu único e solitário orgasmo: pegar alguém colando. Desfilava pela sala esperando apenas uma cabeça para colocar na sua bandeja. Como único gagá na sala era o professor, nenhum aluno ousou tirar suas folhas com letrinhas miúdas do bolso.
Aos poucos, os alunos iam terminando a prova. Por mais que tivessem ido mal, o alivio de saber que no semestre seguinte não teriam que topar com a prepotência daquele pseudoprofessor os consolava.
Estavam na escada novamente. Três meninas, com o caderno aberto, soltavam gritinhos de esperança a cada texto que fazia com que elas se certificassem que haviam acertado. Um grupo discutia em alto e bom som qual era a maneira correta de se preparar chá de cogumelos, e um outro grupo apenas ouvia tudo. Antes mesmo de vê-lo, os alunos ouviram o som do salto do sapato devidamente lustrado do professor. E lá vinha ele novamente. O que ele faria naquela tarde? Corrigiria as provas apenas de cueca na sua cama? Se masturbaria imaginando Platão e Sócrates numa daquelas orgias da Grécia antiga? Jogaria uma partida de truco com o capeta?
E os passos firmes começaram a subir a escada. Naquela ocasião, nem perder tempo com energias negativas os alunos quiseram. A discussão sobre se os cogumelos são cozidos em banho-maria ou não estava mais interessante.
A única coisa que viram foi a maleta marrom, que assim como os pássaros daquela manhã, voou alegremente para a extremidade da escadaria. As folhas brancas, que se soltaram, pairavam no ar, e caiam feito grandes flocos de neve. Em terra, aquela avalanche de arrogância e prepotência deslizava escada abaixo. E como em Romeu e Julieta, os dois amantes estavam caídos no chão, observados apenas por aquele seleto grupo de amigos.
E foi naquela segunda-feira, que Daniel finalmente ensinou filosofia para seus alunos.
Indo contra Karl Marx: Nem tudo que é sólido se desmancha no ar.
sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Conto do pé sem meia.




E Alice abriu os olhos. Permaneceu assim por alguns instantes. Notou, sem ao menos se movimentar, que uma de suas meias havia se “desvestido” de um dos seus pés. O direito, talvez.
E Alice abriu os olhos. Numa fração de segundos voltou a fechá-los. Decidiu que desta vez só iria ouvir. Ainda de olhos fechados levou a mão até a boca e limpou, na manga do seu pijama, uma boa quantia de baba que parecia ter se cristalizado em seu queixo. Embora a baba a pertencesse, Alice não conseguia fazer isso sem esboçar uma cara de nojo. O silêncio começou a incomodá-la. A garota começou a imaginar sua casa pegando fogo, seus pais gritando, suas bonecas derretendo feito o relógio de um quadro que sua professora mostrara há uma semana atrás. Resolveu pensar numa música.
E Alice abriu os olhos. O sorriso que brotou no rosto daquela doce criança só não foi mais rápido que os raios de sol, que varavam seu pequeno quarto cor-de-rosa de ponta a ponta. Finalmente era dia! E sem nem dar tempo de suas retinas se acostumarem com tamanha claridade, Alice saltou da cama. Observou que havia um pequeno pedaço de pano verde do lado de seu travesseiro, e concluiu, depois de alguns segundos, que era sua meia. Alice não teve tempo de pensar em como ela tinha ido parar lá.
O pé sem meia ia deixando marcas de calor no piso de madeira, enquanto o outro, visivelmente encontrava certo esforço para caminhar naquele chão recém-encerado. Desceu as escadas afoitamente, e imaginou que se seu avô a tivesse visto, iria perguntar se ela estava indo tirar o pai da forca. Alice nunca entendeu essa piada, e nunca soube certamente em qual momento da vida ela se encaixa.
Alice parou. Podia ouvir seu coração batendo forte, como se fosse sair pelo seu ouvido. Sua respiração estava ofegante, e hora ou outra a menina inspirava dois ou três fios do seu cabelo para dentro da garganta. Ainda bem que esta colado na cabeça – pensava Alice, sempre que passava o dedo indicador no rosto com a intenção de puxar os fios para fora novamente. Naquela sala estava o motivo daquela noite tão mal dormida. A sala tinha um grande tapete marrom, que cobria quase, se não todo o chão. As paredes brancas faziam com que o sofá, também branco, parecesse um grande bloco de gelo. E lá no fundo, estava ela. Um grande pinheiro, imponente, reinando absoluto em meio aquela decoração tão requintada. Na sua ponta, uma grande estrela prata derretia fios de ouro que entrelaçavam todo o corpo da árvore, parando como gotas de orvalho sob as diversas caixas coloridas que se aconchegavam no macio tapete marrom.
Realmente como se fosse tirar o pai da forca, Alice correu em direção as caixas. Era uma mais bonita que a outra. Tinham laços de todas as cores possíveis, e os mais variados tamanhos de pacotes. Mesmo sem saber ler, Alice reconhecia seu nome, como se ele fosse um desenho, pois sua mãe sempre desenhava olhos e uma trancinha na letra “A”; e assim, a menina encontrou seu embrulho. Era uma caixa grande. Branca. Do seu topo, um grande laço fez com que Alice se lembrasse da namorada do Pato Donald e cogitasse a idéia de mais tarde amarrar aquilo no cabelo com um grampo.
A garota sentia seu rosto queimando, tamanha a felicidade. Eram tantas as coisas que ela havia escrito naquela carta. Seria impossível adivinhar qual delas foi à escolhida. O forninho? A boneca que faz xixi? A casa da Barbie?
Ao olhar dentro da caixa, o sorriso da menina desapareceu. De lá de dentro, Alice puxou um pedaço de tecido azul com algumas rendas. Era um vestido. Com a mesma velocidade que a garota desceu as escadas, ela subiu. Levando na mão apenas o laço, que agora parecia incrivelmente estúpido, ela deslizou para de baixo do seu edredom, arrancou a única meia que tinha no pé e começou a chorar.
Aquele foi o pior natal que tivera.
quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Medalhas


Lembro-me que era uma sala razoavelmente grande. Com cinco ou seis conjuntos de mesinhas verdes, descascadas. Hoje em dia, acredito que o acento de cada cadeira não chegue a minha panturrilha, mas na época, podia até balançar os pés, suspensos no ar. Era uma manhã, talvez de quarta ou quinta-feira, Tia Cátia usava uma jardineira também da cor verde, mas um verde mais escuro, talvez escolhida pela sabedoria de uma mulher que não queria ter a roupa combinando com as mesas da sala de aula. Ela era loira, tinha os olhos claros, grandes, seu corte de cabelo era bem típico dos anos noventa. Dá sua mesa passou o recado para sala. Anunciou que na próxima aula haveria uma competição. E para o ganhador, retirou de sua bolsa preta, que sempre ficava pendura apenas de um lado do encosto da sua cadeira, duas medalhas. Elas eram grandes, pesadas, e muito bonitas. Quando eu as fitei, soube que as queria, pelo menos uma delas.
No final da tarde daquele dia, cozinhei meu ovo e enfiei-o na mochila, junto com uma colher de sopa. Era essa a competição. Corrida com o ovo na colher.
No grande dia, Tia Cátia levou os alunos para fora da sala. Era uma dia muito quente. Lembro-me de sentir cheiro de cabelo queimado debaixo daquele sol; e de que um dos meninos, que usava chinelo, foi obrigado a ficar descalço já que o suor que saia do seu pé transformava aquela poeira do chão de terra numa camada escorregadia de barro. Tia Cátia então separou os meninos das meninas. Explicou como seria a prova. Eu estava nervoso. Mal conseguia segurar a colher e o ovo com a mão, imagine com a boca. E naquele chão seco foram feitos duas riscas, de saída e de chegada. O percurso não era muito longo, mas estava muito quente, e cá entre nós, o sol sempre me deixa sem vontade de viver, ou correr com um ovo e uma colher na boca. Mas meu desejo pela medalha era maior.
Primeiro as meninas brincaram. Brincar é modo de dizer, pois para mim, aquilo era coisa séria. Não me lembro como foi a corrida, pois desde pequeno sou muito egocêntrico. Certamente estava pouco ligando para qual das meninas iria ganhar, só estava pensando em mim naquele momento. Ana Paula ganhou, se não me engano. Ela era uma loirinha nojenta, que todos os garotos queriam namorar. Anos mais tarde, essa loirinha nojenta se tornou uma das minhas melhores amigas, e deixou de ser nojenta.
E finalmente chegou a hora. Estávamos numa posição parecida com a que os presos ficam para serem executados. Do meu lado estava um garoto, não me lembro do nome, mas usava roupas muito estranhas para sua idade. Tinha o cabelo lambido por gel, ou creme rinse, e usava camisa social com bermudas.
Quando ouvi o grito estridente de “já” da Tia Cátia, eu já estava correndo. Olhava para o meu destino, a outra linha do lado da gangorra enferrujada, e para a fila que insistia em me acompanhar, todos juntos. Aos poucos pude ver a pequena dupla de perninhas com bermudas ficando para trás, e os pés, cheio de barro, reclamando que o chão estava muito quente. Eu apenas corri. E como se tivesse sido abduzido, acordei do outro lado da linha, com a gritaria das meninas. Tia Cátia aplaudia, feliz. Até pensei que ela poderia estar torcendo por mim desde o inicio, mas hoje em dia acredito que ela apenas se envolveu naquela bizarra competição. Alguns de meus amigos ficaram realmente felizes, mas alguns, talvez com uma personalidade mais parecida com a minha, usavam desculpas do tipo “A colher dele era mais funda”, “Estou descalço”, “Meus pais estão se separando”.
Já na sala, nem a massinha colorida me empolgava, e quando fomos dispensados, corri. Talvez tenha corrido mais rápido que na própria competição. Não via a hora de chegar ao carro da minha mãe e mostrar a medalha. No banco de trás, a tirei da mochila. Observei-a em silêncio por alguns instantes, e percebi que havia algo escrito na parte de trás: Campeão 91.
Hoje, dezessete anos depois, sei que ainda tenho essa medalha. Lá na casa dos meus pais, naquele quarto que já não durmo mais. No meio daquele armário cheio de memórias, sei que ela esta lá.
E assim são as medalhas que a gente conquista na vida. Verdadeiras medalhas são aquelas que você tem certeza que sempre poderá contar. Não importa há quanto tempo você as tenha conquistado, elas sempre serão suas.
E sempre que eu precisar me sentir um campeão, elas estarão lá para me ajudar. E eu estarei aqui, para faze-las se sentirem sempre valiosas medalhas.


Para todos meus amigos. Os velhos, e os novos.
terça-feira, 25 de novembro de 2008

Infausto




O dia ainda era quase noite. Osvaldo terminava suas ultimas orações. Aquela encruzilhada nunca foi muito movimentada, o que dava mais tranqüilidade para o homem de físico miúdo e pele negra fazer o teu serviço.
Osvaldo trabalha com reciclagem de lixo, percorria quilômetros por dia atrás de papelão, latas, e qualquer outra coisa que possa ser reaproveitada. Numa dessas buscas, ele se deparou com um livro. Embora não tivesse passado da terceira série, Osvaldo era um homem curioso, e praticava sua leitura no que encontrava pela rua. Aquele livro era um verdadeiro “Faça sua macumba em 3 passos”, coisa que, até aquele dia, Osvaldo nunca pensou em fazer. Mas fez.
- Rei das trevas, das profundezas do inferno, peço que interceda por mim. Preciso que a seleção brasileira de futebol perca o jogo contra a Argentina, em troca, serei eternamente teu servo, e minha alma não será mais minha, e sim, tua.
As últimas palavras saíram trêmulas da boca de Osvaldo, quase como se o próprio som das vogais se recusasse a fazer parte desse sacrilégio.
Agora o sol já iluminava toda a rua, e uma legião de trabalhadores, com a cara inchada de sono saia de suas casas, dando inicio a mais um dia normal.
Osvaldo se sentia incomodado pelo que fez, não era de sua personalidade, mas vender a alma ao diabo foi sua única escolha.
Há uma semana atrás, Osvaldo tomou algumas doses a mais de pinga, e acabou por criar a situação mais absurda de sua vida. Paulo, ou Paulão como é conhecido, é um homem robusto, mais gordo do que forte, careca e muito, muito desvirtuoso. Na ultima rodada do carteado, Osvaldo já tinha perdido todo seu dinheiro, estava alto e seu cérebro já não dava muito sinal de vida. Foi nesse estado, que Paulão propôs a Osvaldo a seguinte aposta:
- Terça feira vai ter jogo. Se o Brasil ganhar você me paga o dobro do que já pagou hoje e vou passar uma noite com sua esposa, mas se o Brasil perder, ficamos quites.
Osvaldo aceitou. Agora ali estava aquele homem que já não se sentia como homem, que já não via um futuro. Sua existência passou a ser desnecessária. Tinha apenas um objetivo: Livrar Rosa de Paulão.
Rosa era uma moça de estatura mediana, não era negra nem branca, cabelos bem encaracolados, negros. Uma mulher que apesar dos maltratos, ainda exibia um ar de beleza. Conheceu Osvaldo num baile, no segundo dia já começaram a namorar, na semana seguinte já dividiam a mesma casa, e alguns meses depois já tiveram o primeiro filho, John Travolta; uma homenagem singela de Rosa para o seu ídolo da adolescência.
Osvaldo passou na padaria, comprou dois pães com o único dinheiro que tinha, e foi para casa.
No caminho foi pensando em tudo, estava tão aturdido que chegou a passar pela pequena porta do seu barraco, sem a reconhecer.
- Você demorou homem! Só dois pães?
- É, comi o meu na rua mesmo.
- Fica com essa metade do meu, se vai pra rua, tem que comer mais. Eu vou levar o John pra escola, a gente se vê à tarde.
- Rosa?!
- Que é?
- Se cuida.
Aquela foi a ultima vez que Osvaldo viu Rosa, talvez se tivesse consciência disso teria dado um grande beijo e a agradecido pela grande companhia que ela foi por esses anos, mas tudo isso ficou resumido no “se cuida”.
Na rua, o homem vagava sem rumo. Não queria acompanhar o jogo, seria mais difícil para ele acompanhar o teu futuro em duas partes de quarenta e cinco minutos. Se ele via alguma TV sintonizada no jogo, mudava de calçada, se ouvia em alguma rádio, cantarolava alguma musica, geralmente alguma sertaneja, pois o fazia lembrar de seu pai.
Ainda não acreditava que além de perder a alma, poderia perder Rosa. Sabia que Paulão não era homem de brincadeira, e que era bem capaz de pegar Rosa a força em algum beco daquela cidade depois daquele jogo. Pensava no filho, e como gostaria de ter sido um pai melhor. Ter levado mais vezes o garoto para o parque, lembrou da vez que levou o garoto ao circo, e como eles se divertiram com um macaco que sabia andar de bicicleta. Aquelas lembranças comprimiam mais o seu peito. Aquela altura, o jogo já estava quase acabando, suas mãos tremiam, e Rosa flutuava em sua cabeça.
Só no terceiro bar que Osvaldo entrou tinha TV, e claro, estava sintonizada no jogo.
O Brasil perdeu. Paulão perdeu, eu perdi – pensou Osvaldo. Estava livre da pressão de Paulão, mas agora sofria a pressão de uma força bem mais forte. Será que a tal macumba havia realmente funcionado? Agora sua alma já pertencia ao demônio?
- Paulão?
- Quem é o filho da puta que me liga a cobrar?
- È o Osvaldo, Paulão! Posso ficar tranqüilo agora? Estamos quites?
- Estamos quites sim. Agradece a Deus, três a zero foi presente pra você!Vai cuidar da tua vida e aprende a jogar baralho, vacilão.
Osvaldo saiu do bar, estava mais leve. Rosa e seu filho estavam seguros. Mas a tranqüilidade durou pouco, o badalar de um sino de alguma igreja nas proximidades trouxe Osvaldo de volta a realidade, de volta a tua vida de condenado.
- É um chamado! Esse sino! Sei que o que fiz foi errado, quero pedir perdão a Deus. Criar meu menino... A gente tem muito macaco de circo pra ver ainda!
Osvaldo foi em direção a igreja, nunca sentiu tamanha fé em algo superior antes, afinal, Deus não foi muito generoso com ele e sua família desde quando ele ainda estava na barriga de sua mãe, mas agora, estava decidido. A macumba não podia ter dado certo, as velas nem eram da cor certa, e ele não usou galinha alguma, pois se tivesse uma galinha, teria comido na noite anterior quando dormiu mais cedo pra não sentir mais fome.
Ao atravessar a rua, um carro vermelho virou a esquina num rompante, acertando em cheio o corpo franzino de Osvaldo, que rodopiou no céu, como se fosse um balé de despedida. Seu corpo cai num estrondo seco no chão. O silêncio só foi quebrado pelo desespero do motorista, que correu em direção ao corpo de Osvaldo, segurando uma garrafa de cerveja e vestindo uma camisa da Argentina.

Horóscopo

Aquário – Você se sentirá como se peixes nadassem no seu estômago. Talvez, essa seja a hora de limpar toda a merda que eles fizeram. Frase do dia: “Não devia ter saído de casa”.

Gêmeos – Matar o seu irmão não vai dar fim às comparações. Abuse de acessórios ou faça uma plástica. Cor: Azul, se você for o gêmeo mal, como a Raquel, ou Amarelo, se você for o gêmeo bom, como a Ruth.

Câncer – Dê uma seção de quimioterapia nesses sentimentos rancorosos e mesquinhos. Perca o cabelo, mas não o controle. Frase do dia: “Me ajude doutor, me ajude!”.

Peixes – Não nade contra a correnteza. Colocar a boca em qualquer minhoca poderá lhe causar problemas futuros. Cor: Para não se parecer com uma baleia, use preto.

Touro - Você não tem culpa se sua parceira é uma vaca. Não se menospreze, até Rodrigo Santoro levou chifres um dia. Frase do dia: “ Eu odeio o Burger King”.

Áries – Arianos não são a raça suprema, foi apenas um devaneio de Hitler. Mantenha-se longe de Higienópolis. Frase do dia: “ Preto não, afro-descendente”.

Escorpião – Você anda mais venenoso que o Leão Lobo. Falar sempre o que pensa, pode ser o fim da picada. Procure não balançar muito o rabo, pessoas podem sair machucadas. Cor: Não importa, mas vista-se para matar.

Leão - Os seus problemas você deve esquecer, isso é viver, é aprender. Frase do dia: Hakuna Matata”.

Capricórnio – Você já percebeu que está com bode da vida? Pare de ficar ruminando problemas. Dê um coice nas frustrações diárias. Cor: Amarelo Ouro acetinado fosco.

Libra – Três ponto quarenta e oito reais. Dólar: Dois ponto vinte e oito reais. Euro: Dois ponto noventa e um reais. Bovespa desaba 7, 75 %.


Sagitário – Sua parceira reclamará de suas atitudes. Às vezes você age como se fosse metade animal. Que tal levar sua paquera para cavalgar? Deixe-a segurar as rédias da relação. Cor: Não se preocupe, o tamanho do seu pênis já lhe trará bons frutos.

Virgem – Pare de miguelar essa mixaria. Depois de um tempo, você perceberá que a dor nem é tão forte assim. Frase do dia: “ Vai de vagarzinho, que eu agüento”.

Sonhos....

Às vezes as pessoas passam a vida inteira em busca de um sonho. Esses guerreiros são capazes de enfrentar exércitos gigantescos, de destruir monstros de quatro cabeças e de cruzar os quatro cantos do mundo, tudo isso, em busca de sua realização pessoal. Mas muitas das vezes, esses guerreiros morrem antes mesmo de beijar a sofrida princesa no alto da torre. Não importa o quão extraordinária tenha sido sua jornada, o quanto bravamente ele tenha lutado; em um deslize, tudo pode virar apenas mais um pseudo-conto de fadas. A questão é: Vale a pena gastar as paginas do livro da sua vida com sonhos, e deixar a realidade ocupando apenas o último capitulo – a morte­ ?
O prazer de sonhar, de planejar o dia de amanhã, com todos seus desejos e metas é algo intrínseco do ser humano. Sonhar com o futuro funciona para nós como uma alavanca estimuladora para vida. Tirando Jesus, acho que ninguém teria força vital para continuar vivendo sabendo que o seu final não será dos melhores. Se o príncipe não sonhar com o sabor do beijo da princesa, não há motivos para arriscar-se a levar uma cuspida de fogo do dragão no traseiro. Mas também, não posso deixar de mencionar que se o príncipe amarrar seu cavalo, deitar ao lado de um riacho e passar a vida imaginando o quão suaves devem ser os lábios daquela donzela, bom, quando ele resolver escalar a torre, a osteoporose poderá impedi-lo.
Sonhar torna tudo acessível. O sonho rega a realidade com gotas densas de esperança. Ele foi responsável pelo avião, pela energia elétrica, pelo telefone, pela cura de muitas doenças, por impossíveis amores, pelo esquecimento de antigos temores. O ato de sonhar deve estar incluso na nossa realidade, e não o contrário. Sonhar é um verbo, e como tal, exige ação. Exige movimento. Exige esforço.
O grande segredo é sempre ter certeza de que há, em algum lugar, alguma torre com uma princesa a sua espera, e que você pode chegar até lá. Mas não deixe que esse sonho o cegue a ponto de não ver que a princesa não passa da bruxa disfarçada, ou que a humilde aldeã é centena de vezes mais bela que aquela enjoada princesa.
Sonhe vivendo, mas jamais viva sonhando.

Carlos Gouveia

Primeiro post.... Again

E mais uma vez, a idéia de ter um blog (mas dessa vez, sério!) bate na minha cabeça. Não que seja uma coisa difícil “bater na minha cabeça”, levando em conta que ela deve ser pouco coisa menor que um jaca madura (Ok, agora vc acha que eu tenho aquela doença que as pessoas são cabeçudas e... Meu Deus! Será que eu tenho???), mas é que vire e mexe eu tenho vontade de escrever, mas sou um ser humano tão complicado, tão geminiano, tão vagabundo, que do mesmo jeito que bate, rebate.
Mas ultimamente pensei seriamente. Já estou com vinte e três anos, fazendo faculdade, procurando um estagio, e não posso mais passar as minhas tardes assistindo TV, posso? Claro que posso, faço facul de Rádio e TV, não deixa de ser um estudo, mas se eu tiver um blog, vou poder escrever e praticar... e como diria Leila Lopes “Praticando, vc fica fodão”, no caso dela, fodida. A propósito, essa afirmação é falsa, posso ser processado? Bom, se um dia a Leila Lopes falar do meu blog no Super Pop, eu até pago os danos morais....
E cá estou eu, me entregando a esse mundo virtual tão deprimente, tão repleto de pessoas feias que se passam por bonitas, de pessoas pobres que se passam por ricas, e de caras de 48 que se passam por 12 só pra xavecar crianças...Que mundo é esse...
Outra coisa que sempre me faz parar de escrever é a magoa. Não que eu fique magoado, pra te falar a verdade, to pouco me fudendo pra um monte de coisa, a questão é a magoa que eu posso causar nas pessoas. Se eu escrever aqui tudo o que penso, vou ter q ser uma dessas pessoas feias que se passam por bonitas, pq quantos amigos meus sobrariam??? Obviamente, meu numero de amigos no orkut aumentaria, mas acredito que minha moral perante a sociedade seria abalada... E a moral de muitos tbm hauhauuahhau! (risada maléfica).
Acho que isso, como já devem ter visto, não estou inspirado pra escrever agora, talvez não esteja nunca mais... Mas já que entrou aqui hj, tira 5 minutinhos do tempo que vc fica vendo pornografia, e da uma passada aqui só pra ver. Vou falar da lorota do aquecimento global, da bizarrice da evolução, e de como a mídia abafou o lance do Cabrini e as cocaínas...
Vê se volta, antes que seja tarde demais, ok?

PS: To vendo o jornal da Record. No GC ta assim “Emergência: Temporal mata 82 pessoas” E na imagem, mostra 4 pessoas, no meio da enchente,com água até a cintura, jogando voley... Daqui a pouco vai ter uma mulata sambando no telhado de alguma casa...Eu amo esse país....